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Por que transparência importa para a moda?
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Por que transparência importa para a moda?

Quando o edifício de produção de roupas Rana Plaza desabou em 2013, matando mais de 1.100 pessoas e ferindo outras 2.500, muitas marcas não sabiam que produziam ali. Etiquetas de grandes varejistas mundiais foram encontradas nos escombros - junto de corpos de costureiros e costureiras bangladeshianos.

A tragédia, além de dar origem ao movimento global Fashion Revolution, revelou como as estruturas da indústria da moda são frágeis, cruéis e carecem de transparência. Ainda não sabemos quem faz nossas roupas e os trabalhadores da moda são, muitas vezes, tidos como invisíveis.

Com a criação do movimento, sua pergunta norte “quem fez minhas roupas” se difundiu e motivou a criação do Índice de Transparência da Moda.

O projeto existe globalmente desde 2016 e revisa e classifica marcas de acordo com a disponibilização pública de dados em seus canais sobre suas políticas, práticas e impactos sociais e ambientais. Ele não é um índice de sustentabilidade, tampouco um guia de compras, mas sim uma ferramenta que possibilita a transformação da indústria da moda para cidadãos, sindicatos, trabalhadores, setor público e iniciativa privada.

No Brasil, o Índice ganhou sua primeira edição em 2018 e hoje desenvolve sua terceira, que analisa 40 grandes marcas e varejistas entre segmentos variados e tem a data de lançamento para o dia 27/11, integrando a programação do Rio Ethical Fashion. O México também ganha sua primeira versão em breve, ainda no ano de 2020.

O que revelou o Índice de Transparência da Moda?

O Índice de Transparência da Moda nos permite visualizar como as marcas ainda carecem de informações públicas sobre seus processos e produção. Conhecer o produto que compramos, de onde veio, como e com o que foi feito é um direito enquanto consumidores, e uma necessidade enquanto cidadãos engajados na construção de um mundo melhor para pessoas e planeta - afinal, não existe planeta B.

Na edição brasileira de 2019, foi pesquisado, entre outros tópicos, como as empresas divulgam suas práticas de compra, sua pegada de carbono e seus esforços para garantir um salário justo para viver. 

As práticas de compra na moda são a maneira como as marcas se relacionam comercialmente com seus fornecedores; elas incluem condições e prazos de pagamento.

Meg Lewis, gerente de campanha da Labour Behind the Label (organização que atua em prol dos direitos de trabalhadores do vestuário), relata que “no contexto da crise do Covid-19, podemos ver como as práticas de compra de grandes marcas são projetadas especificamente para limitar as obrigações das marcas com os fornecedores. As grandes marcas geralmente pagam apenas após a entrega das mercadorias, o que possibilitou cancelamentos em massa e descontos impostos, incluindo pedidos concluídos ou em produção. Isso permitiu que as marcas minimizassem a perda de lucro, enquanto os fornecedores não podiam pagar aos trabalhadores.”⁣

De acordo com a Ethical Trading Initiative (organização que atua em parceria com empresas, sindicatos e ONG 's para promover trabalho decente), as condições de trabalho das pessoas de uma cadeia produtiva são de responsabilidade dos fornecedores que as contratam. Porém, essa responsabilidade pode ser prejudicada pelas práticas de compra de seus clientes, que muitas vezes costumam baixar os valores e condições de pagamento de seus pedidos. Esses mesmos clientes são aquelas marcas e varejistas que pressionam os fornecedores para cumprir suas políticas e critérios de compra sociais e ambientais.⁣

Já a pegada de carbono calcula qual a emissão média de gás carbônico (CO2) emitida por algo ou alguém - seja corporação, indivíduo, comunidade, etc. A indústria da moda tem a sua: em 2015, a Global Fashion Agenda apontou que ela emite 5% do CO2 mundial. O ITMB 2019 mostrou que apenas 17% das empresas publicam anualmente esses dados referentes às suas próprias instalações e somente 10% publicam anualmente dados referentes à sua cadeia de fornecedores – onde ocorrem mais de 50% das emissões do setor (Quantis).

Por fim, o salário justo para viver é uma definição para um salário que permite um padrão de vida decente para o trabalhador e sua família, incluindo valores dignos para alimentação, moradia, educação, saúde, transporte, roupas e outras necessidades essenciais, assim como provisão para eventos inesperados; ele é tipicamente maior que o salário mínimo ou acima da linha de pobreza. No ITMB 2019, apenas 10% das marcas divulgavam seus compromissos de garantir um salário capaz de cobrir os custos de vida básicos dos trabalhadores de sua cadeia de fornecimento.

Além disso, o Índice também aborda tópicos como divulgação da igualdade salarial e de gênero e raça nas empresas, monitoramento de práticas que violam direitos humanos, informações sobre os impactos ambientais e uso de água, etc. 

A transparência fortalece os negócios

Estudos da Ethical Trading Initiative mostram que a transparência ajuda a criar um campo de atuação mais nivelado entre as marcas, constrói uma imagem sólida e a confiança do consumidor, dos fornecedores, parceiros e investidores. Comunicar de forma coerente, clara e acessível sobre o andamento da marca é uma forma de aproximar todos ao longo da sua extensa cadeia; em um mundo cada vez mais plastificado, motivado pela imagem superficial que a internet pode ancorar, é importante romper com essas barreiras.

É preciso falar abertamente sobre custos, conquistas e aspirações, mas também sobre as dificuldades, o que não deu certo e o que deve ser melhorado ou extinto. Dessa forma, podemos fortalecer uma rede de apoio, compartilhamento de boas ideias e formas de superar os percalços e crises.

Esse é o primeiro passo de uma longa jornada

Ser transparente não é ser sustentável. A transparência é um primeiro passo e uma ferramenta de prestação de contas, que possibilita encontrar informações sobre como empresas trabalham e impactam com a Natureza e sociedade. Ou seja, sua prática permite a construção de um caminho mais responsável e justo para a moda. 

Uma empresa transparente oferece informações para os cidadãos sobre como produz suas peças, como monitora sua cadeia produtiva para que não haja violações humanas e ambientais, quais políticas adota para ser inclusiva ou diversa, como repara o racismo e o sexismo em ambientes de trabalho, entre outras práticas. ⠀

Faça um exercício: entre no site da sua marca favorita, ou da sua última compra de vestuário, e procure informações sobre onde as roupas são produzidas, com qual matéria-prima, como são distribuídas, qual a pegada hídrica e de carbono da peça. Se você encontrar, me conte. Se não, continue perguntando “quem fez minhas roupas” e acompanhe os próximos passos do Índice de Transparência da Moda Brasil em 2020.

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